sexta-feira, 22 de outubro de 2010

2- SERINGAIS E SEUS ATORES


Revisão Historiográfica: BONIFÁCIO CABRAL DE MELO NETO[1]

ANTONAECI, Maria Antonieta. Cultura, trabalho, meio ambiente: estratégias de “empate” no Acre. In: Revista Brasileira de História. Nº 28, São Paulo: Marco Zero. 1994.

FONTES, Edilza. Batalha da borracha, a imigração nordestina e o seringueiro: a relação história e natureza. In: NEVES, Fernando Arthur de Freitas e Lima, MARIA, Roseane Pinto (ORGS). Belém, Paka-tatu, 2006.

FRANCIANE LACERDA. A vida e o trabalho nos seringais.


            Edilza Fontes, ao escrever sobre o tema “Batalha da borracha, a imigração nordestina e o seringueiro: a relação história e natureza, pontua em específico a preocupação homem-natureza, homem-espaço. Entende-se que em função de tal preocupação voltada para o ecológico na mentalidade de que o seringueiro tanto da região amazônica como o imigrante nordestino desenvolveram uma relação com a natureza de exploração auto-sustentável.


“Neste sentido, o interessante nas novas abordagens que estão discutindo as relações propostas entre homem e natureza é incorporar à noção de tempo histórico as temporalidade necessárias para mudanças ambientais para adaptações do homem, no caso o seringueiro ao ambiente da floresta.” (FONTES, Edilza. P.63. 2006)


            A autora citada anteriormente quando fala de adaptações do seringueiro ao ambiente da floresta é explicado no sentido de aprendizado desenvolvido pelo nordestino ao explorar os seringais na floresta, numa relação de sobrevivência, “A relação com a natureza é muito forte na medida em que homens passam a viver na floresta e têm que aprender a sobreviver dela.” (FONTES, Edilza, p.64. 2006)
            Está posto que a relação do nordestino com a natureza acontece com muito respeito com a mesma, uma vez que este homem do nordeste, ao sair de sua terra, o fez pelo fato de ali se vivia um período de seca intensa, além de que a viagem até a Amazônia fora com muito sofrimento, neste particular tem-se Maria Antonaeci dizendo que: “Daí que 1877 – quando forte seca no nordeste foi explorada, propiciando migração subvencionada à Amazônia.” (ANTONAECI, Maria. P.93, 1994)
            Os nordestinos, tanto no primeiro quanto no segundo ciclo da borracha, fantasiaram a situação, pensando que, ao chegarem na Amazônia, teriam sua situação financeira resolvida, o que na verdade experimentaram foi um modelo de relação de trabalho de exploração de aviamento e de um idealismo nacionalista falacioso do governo Vargas, quando convocou o chamado soldado da borracha para participar da II Guerra Mundial com a mensagem de que este sustentaria os homens em combate ao fornecerem látex aos americanos (E.U.A) para produção de botas para os soldados, pneus para os carros, etc.
            Antonaeci, apresenta em sua produção, “Cultura, trabalho, meio ambiente: estratégia de “empate” no Acre”, um outro momento (tempo) histórico, em especial, que se reporta ao governo militar, na gestão do presidente Médice (década de 70), que apregoou a mensagem “vá para Amazônia que o governo dá cobertura”. Inicia-se neste contexto a chegada do sulista, que precisa de muita terra para a criação de gado, que é chamado de “bovinização” da Amazônia. Então, tem-se o uso dos motosserras que produzem derrubadas e consequentemente queimadas em larga escala, observa-se ainda, como conseqüência desses empreendimentos desse novo modelo econômico, uma expulsão do homem do meio rural para o urbano, pois dar-se neste momento a perda da terra, via grilagem e a própria floresta de onde provinha o sustento do seringueiro, agora estava sendo destruída.       O que se tem agora é um verdadeiro caos social, tanto no meio rural quanto no urbano.
            No meio urbano, nos relatos de Maria Antonaeci é mostrado um inchaço, onde se teve um novo re-significar do homem da Amazônia que está na cidade do Rio Branco. Estes passaram a ser marreteiros, engraxates. As mulheres eram lavadeiras, biscateiras, domésticas, diaristas, funcionárias públicas. Em meio a tudo isso, tem-se aquelas que não tiveram opção a não ser a prostituição. A autora, para mostrar de fato o caos, apresenta o caso dos hospitais de doenças mortais, sendo lotados pelos que migraram do meio para o urbano.
            No meio urbano, a resistência se deu de forma mais conflituosa, pois, inicialmente, a forma estratégica foi a luta armada compara à “guerrilha de selva”, porquanto estes homens da floresta se recusam a sair de seu meio ambiente, chamado pela autora de colocações.


“...Num contexto em que, em diferentes regiões do Brasil, trabalhadores urbanos construíam “estratégias de recusa” diante do autoritarismo patronal e militar, dos seus arrochos salariais e compressões de direitos e liberdade, seringueiros, castanheiros e trabalhadores do Acre pegaram em seus terçados, facões espingardas – enquanto instrumento de trabalho – para desenvolverem estratégias de empate...” (ANTONAECI, MARIA. p.100. 1994)


            A prática também evoluiu para tocaias, onde os homens da floresta começaram a matar os donos de gado. Outra forma de empate era não vender produtos nos barracões, outros fugiam do seringal, até que evoluiu para organizações coletivas, tais como cooperativas, sindicatos dos trabalhadores rurais. Diz a autora que da resistência nasceu o seringueiro “liberto”.
            A floresta e o que ela sustenta e produz é a mãe do homem que nela se encontra. Está formado, construído um sentimento de existência do homem da floresta e de pertencimento.


“A castanheira e a seringueira são como se fossem nossas mães quando nossos pais vieram do nordeste para cá, tiraram delas o sustento. Foi com leite de castanha que nos criaram. Foi com leite de seringa que nos vestiram.” (Apud. ANTONAECI, Maria, Varadouro Nº 10, junho 1978)


            Ainda se abstrai do discurso de ANTONAECI, o fato de que os movimentos dos sem emprego na área rural, ao se organizarem efetivam um projeto de conscientização de sustentabilidade da Amazônia, objetivando intensificar a resistência, agora não vendendo suas terras e de forma pacífica resistindo, bem como implantando escolas, pois o povo, em sua maioria, era analfabeto.
            O processo evolui até uma idéia de Conselho Nacional do Seringueiro para implemento de projetos do governo e de grandes grupos de poder, e assim, em fim de 80, já obtinham o resultado de impedir que 1200 hectares fossem destruídos, além de que estavam obtendo êxito em tomar áreas em reservas extrativistas.
            Em meio a tantos “embates  e empates”, os seringueiros conseguiam se divertir e criavam suas festas, eram seus momentos de socialização e solidariedades e revelação de suas culturas, que hora eram híbridas hora conservadas.


“...Vemos então que nos seringais distantes das luzes das cidades, à luz de lamparinas e fogueiras, os moradores buscavam manter sua ligação com o seu lugar de origem, com a sua regionalidade, com as suas raízes culturais...valorizando antigas tradições culturais e certamente criando outras ou adaptando-as a este novo novo espaço...” (FRANCIANE LACERDA. P. 310)


            Pode-se ver nas discussões dos autores que, embora o foco se diferencie, é notório o olhar ecológico e de exploração da floresta de forma sustentável, bem como a busca pela reflexão da situação social que envolve o homem da floresta Amazônica, onde se tem em evidência as relações desiguais, por conta da desconsideração de cunho valorativo do homem da floresta e sua relação com o meio, pois tanto o governo quanto seus projetos para a Amazônia como os grupos de poder financeiro não têm tido uma relação de sustentabilidade e sim de exploração na região amazônica.




[1]Licenciado em História (UVA), Bacharel em Teologia com Habilitação em Educação (FATEBE), Pós-Graduado em Ensino da História do Brasil (FACULDADE IPIRANGA).

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